terça-feira, 22 de novembro de 2022

Fala

Eu falo. Falo muito. Falo pelos cotovelos. Tagarela, espevitada, ansiosa e acelerada.

Falo acordando, ao caminhar, comendo, brincando, chorando, dormindo.

Falo porque existo. Porque preciso estar consciente do que sinto.
Falo porque o peito grita. Para me lembrar que estou viva. Que sou de carne, mesmo ela quase estando no osso. Para me lembrar que quando se arranha arde, que quando machuca arranca, que quando derrubam, eu caio, mesmo achando que não. Falo e grito porque chorar as vezes não basta. Para me lembrar da dor quando me esqueço. Para estar consciente que ainda existo, apesar de. Do nada, do tudo, e de todas as coisas que deixam de ser importantes quando o tempo passa, mesmo quando a carne ainda parece sangrar.

Falar parece não mudar nada, mas me lembra de tudo. Porque falar, às vezes não me leva a causa, mas surte efeito. Me lembra que tenho raiva, que tenho rancor, que tenho desejo e que tenho amor.

Falo porque quando me perco no silêncio, descubro que às vezes ele é a morte de coisa alguma, ou do todo que me resta. Nunca se sabe.
Falar me leva ao chão enquanto me encaminha para o perdão.

Falo porque palavras me deixam viva, mesmo quando acho que estou prestes a partir.

(Autora: @daniquartezani )

quinta-feira, 17 de novembro de 2022

 

  

Há borboletas em todo lugar. As borboletas que deveriam estar no meu estômago, estão voando pelo meu corpo inteiro. Entre uma perna e outra, passando pelos meus pés, joelho e cabelo.

Elas contornam meu pescoço e brincam sobre meu rosto, que ao sol exposto reluz suas asas a bater. Borboletas atravessam diante dos meus olhos e pousam no meu nariz trazendo o gosto de mais uma vez me apaixonar e de sempre ficar por um triz.

Sobrevoam o meu ventre, minhas costas, tropeçam nos meus ombros, seios, umbigo e em todas as palavras que você me diz. Eu tento me afastar, mas elas querem ficar comigo e assim me fazer mais feliz.

E pra finalizar seu vôo, elas entram na minha orelha e deslizam pela minha boca, como eu sempre quis. Pra depois irem embora, correndo pelo meu clitóris, subindo nas minhas coxas e escorrendo pelos meus quadris.

Há borboletas em todo lugar, no meu peito vazio por falta do seu abraço, nas minhas mãos pequenas e nos meus dedos em pedaços. Certamente não existe em mim um espaço, em que as borboletas não consigam dançar. 


sexta-feira, 4 de novembro de 2022



Eu te amo como um sentimento desperdiçado, feito água que cai pelo ralo, que se perde e nunca mais se vê.

Eu te amo como um leite derramado, no chão ou no fogo depois de ferver. As águas passadas que aqui habitam, nunca se secam e insistem em verter. 

Me perco em mim pra me encontrar em você, mas perco você sem nunca ter me ganhado pra conseguir perder.



domingo, 14 de agosto de 2022


"Aprendi a mergulhar no teu mar.
Nunca amei alguém como amo você.
Nunca admirei alguém como admiro você.
É que o amor, é algo diferente, mas que nos dá vida.
Foi por amor que Jesus veio e é por amor que somos salvos.
E eu mergulhei profundamente no seu rio e ainda assim não me afoguei.
Aprendi a nadar e a cada vez mais te amar...
Vi seus erros, seus pedaços de uma madeira molhada, mergulhada no seu mar.
E apenas tive vontade de consertar.
E tive mais vontade de ficar.
Encontrei alguns tubarões dos quais quase me atacaram mas ainda assim continuei lá...
Aprendi a acalmá-los e amá-los.
Pois o seu defeito, pode ser o mesmo de muitos e os mesmos dos meus...
Daquele rio não queria mais sair.
Queria poder ficar lá, mergulhar e mergulhar...
Para aos poucos te encantar, te mostrar as coisas que pode estar perdendo...
Tudo pra te ver bem
Mas
Nem tudo é como queremos
E...
Talvez seja melhor apenas aceitar, que um dia eu mergulhei fundo
 e não me arrependi de te amar..."
(Isadora Melo)

 

terça-feira, 25 de janeiro de 2022

Palavra

palavra
pa·la·vra
sf
1 LING Unidade mínima com som e significado que, sozinha, pode constituir um enunciado; vocábulo. 2 Unidade da língua composta de um ou mais fonemas que, em língua escrita, se transcreve entre dois espaços em branco. 3 GRAM Unidade que pertence a uma das grandes classes gramaticais, como substantivo, verbo, adjetivo, preposição etc. 4 Manifestação verbal ou escrita. (Dicionário Michaelis)
Às vezes tudo o que a gente precisa, é de uma palavra.
Frequentemente dependemos de um sim ou de um não. Muitas vezes precisamos de uma palavra que nos dê direção, ou de uma palavra que nos ajude a tomar decisões. Esperamos uma resposta, um resultado, uma ligação, esperamos por uma determinada palavra que só nós mesmos sabemos exatamente qual é. Outras vezes carecemos de uma palavra de ânimo ou de consolo e quase sempre precisamos de um conselho. Uma simples palavra pode ser um alimento para a nossa alma. E que diferença pode fazer uma palavra amiga, não? Gosto de uma música do Legião Urbana que diz"Sei que às vezes uso palavras repetidas, mas quais são as palavras que nunca são ditas?" E isso sempre me fez refletir: Qual será a palavra certa? E quem terá a palavra certa para mim?
Eu acredito que a palavra em si, tem poder e importância muito grandes. A palavra certa na hora certa pode mudar tudo, assim como a palavra desnecessária ou indevida pode ferir, desagradar. É incrível pensar que a solução de todo um problema pode depender de uma simples palavra, escrita ou verbalizada. Pois palavras libertam, palavras matam, palavras curam e também podem criar.
Voltemos para Gênesis quando Deus disse: "fiat lux!" que significa "haja luz!" e então... houve luz. No caso, a voz de Deus teve um poder criativo, assim como nossas próprias palavras também têm. Nossas palavras têm o poder de construir ou de destruir. Palavras são sementes, palavras criam e criam para o bem ou para o mal. Algumas palavras podem gerar afeto, expressar carinho, porém algumas palavras acabam gerando discórdia ou criando conflitos. No livro de Tiago, o autor faz algumas metáforas para exemplificar o poder e a função da palavra verbalizada. Ele diz que até o cavalo é domado, com um freio em sua boca, mas a língua é indomável e não nos obedece. Os navios, mesmo sendo grandes e batidos por ventos fortes, são dirigidos e controlados por um pequeno leme, assim como a língua, pequeno órgão, se gaba de grandes coisas e conduz, muitas vezes, o corpo todo à ruína. Ela é como o fogo, que pode causa um estrago enorme, assim como uma simples fagulha pouco a pouco é capaz de incendiar uma floresta inteira. A língua é um mal contido, carregado de veneno, pois há palavras de vida e palavras de morte, e só aquele que é sábio é capaz de comer dos seus frutos. 
Em contrapartida, como uma antítese, ou um antídoto para tal veneno, temos o silêncio, onde a palavra sai de cena. Segundo o pastor e psicanalista Villy Fomin, existe um silêncio que constrange e que incomoda. O silêncio pode ser calmaria, mas também pode ser omissão ou até mesmo confronto, porque existem posturas silenciosas mais danosas do que gritos, pois o silêncio tem a capacidade de dizer coisas que as nossas muitas vozes e palavras não são capazes. E muitas vezes, o não agir, não fazer nada, pode ser nossa melhor ação. Ou seja, o ato de se calar também pode comunicar algo. Às vezes o silêncio traz verdades terríveis, inconvenientes, porque ele não é dado a amenidades. Ele grita através de um telefone mudo, uma mensagem lida e não respondida, uma conversa monossilábica. São momentos silenciosos que falam sobre desinteresse, esquecimento, recusas, apatia, desespero. Muitas coisas são ditas na quietude, depois de uma discussão e pior do que uma discussão insistente é um silêncio que fala. Simples, rápido, forte. 
O perdão não vem em um beijo, mas sim depois de longos momentos de reflexão. Introspecção cura, mas também pode ser a ante-sala do fim. Palavras articulam argumentos, expõem queixas, tentam ser explícitas, mas nem sempre são justas ou compreendidas. Há um grande abismo entre o que eu falo e o que o outro entende. Nessas horas o silêncio pondera, isola, intimida. O silêncio perturba justamente porque ele fala e fala bem alto.

Por falar em silêncio, gosto de lembrar que o nome de Deus é impronunciável em algumas culturas judaicas ortodoxas. Pois alguns rabinos acreditam que esse nome: Yahweh ou Javé é algo muito sagrado, muito santo e misterioso e que não se deve ser falado em qualquer ocasião, ou como diz o mandamento: não pode ser falado em vão. Essa palavra no hebraico possui apenas quatro letras, Y H V H (Iod, He, Vav, Heh) e que a pronúncia dessas letras juntas se parecem muito com o som da própria respiração, por isso a consideram impronunciável. Quer dizer... Será que o nome de Deus é o som da nossa respiração? Na verdade eu não sei, o que eu sei é que a palavra tem um peso muito grande e é necessário ter muita sabedoria para conduzir nossas próprias palavras para o bem, para algo bom.

Eu que falo pelos cotovelos e falo muito por impulso, acabo "pecando" nessa questão. Já magoei pessoas queridas, já afastei pessoas importantes... tudo por não saber lidar com meus pensamentos e palavras. Conheço bem o amargo remorso e a culpa de uma palavra falada na hora errada, ou da maneira errada, então controlar a língua é um grande desafio para mim. Sempre que falho nisso, me lembro das sábias palavras da minha tia no velório da minha avó: "quem fala menos, erra menos".

Pra concluir, eu espero que nós possamos refletir sobre nossas próprias palavras e buscar sempre falar com amor, mesmo que sejam verdades difíceis de se ouvir, que sejam ditas com amor. E por fim, que nós saibamos detectar sempre qual a palavra certa que nós buscamos e quem a detêm. 


Palavras ao vento - Cassia Eller

Ando por aí querendo te encontrar
Em cada esquina paro em cada olhar
Deixo a tristeza e trago a esperança em seu lugar

Que o nosso amor pra sempre viva
Minha dádiva
Quero poder jurar que essa paixão jamais será

Palavras apenas
Palavras pequenas
Palavras, momento

Palavras, palavras
Palavras, palavras
Palavras ao vento

https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/palavra/
https://www.significados.com.br/fiat-lux/
https://www.letras.mus.br/cassia-eller/44927/