Me incluo no grupinho das pessoas que se importam muito com
a justiça própria, então você já imagina como o perdão e as mágoas são difíceis para mim. Mas sabe, posso citar
exemplos em que consegui perdoar de fato sim, consegui deixar mágoas para trás.
Foi um processo longo e demorado, mas essas experiências me deram esperança
para estar aqui escrevendo sobre isso. E você? Já se sentiu injustiçado? Desrespeitado? Já te magoaram tão
profundamente que parecia que você nunca iria perdoar o que te fizeram? E
depois de toda essa auto-análise e conclusão de que deram mancada com você, você
de fato, perdoou?
Primeiramente, vamos pensar um pouco a respeito do perdão em
si.
Perdoar é reconhecer que fomos maltratados, usados, lesados,
desrespeitados ou injustiçados por alguém. Para perdoar, precisamos enfrentar
sim, essa situação de que fizeram algo de ruim pra gente. Em segundo lugar, existe um fluxo,
você perdoa porque já foi perdoado e se você não perdoa, você bloqueia esse fluxo
que é o perdão. Portanto algumas pessoas que não receberam perdão ou que nunca
se sentiram perdoadas dificilmente vão passar isso adiante, porque perdoar é
passar aos outros, o que você tem recebido. Em terceiro lugar, perdoar não é o mesmo que esquecer. Perdoar é, muitas vezes,
relembrar e infelizmente talvez não haja reconciliação entre as partes, porque
algumas coisas não voltam a ser como eram antes, ou demoram. E além disso, perdão
e restituição da confiança são coisas diferentes. Em quarto lugar, o gesto de perdão exige esforço e abdicação de orgulho ou
razão, e não significa necessariamente esquecer a ofensa, mas deixar de levá-la
em consideração.
Repare que na maioria das vezes, nós não nos magoamos com
instituições, e sim com pessoas. Pessoas magoadas, magoam outras pessoas...E ter dificuldade de falar o nome de tal
pessoa é um sinal de que não se perdoou ainda. Sempre nos referimos
a esse alguém como “meu ex” “minha amiga” “meu pai” e nunca com o nome de cada
pessoa, porque às vezes dizer tal nome dói demais e provoca
algo dentro da gente. Se você não consegue pensar nessa pessoa sem se lembrar do
que ela fez a você, é sinal de que não perdoou de verdade.
Imagine um mar de mágoas aonde você vai se afundando cada
vez mais... Perdoar é vir à superfície da água e respirar. Eu penso que as mágoas nos sufocam da mesma
maneira. É algo muito difícil de carregar conosco. É um peso.
Perdoar não é livrar alguém das consequências, pois toda
ação provoca uma reação.
O perdão é um processo, demora algum tempo, não é algo
instantâneo, se você diz que perdoa no mesmo instante em que algo acontece talvez
você não esteja perdoando realmente. O perdão é para os fortes!
Quinto lugar, seu perdão não pode depender dos outros, não se pode ficar
esperando pelos outros entenderem o que houve, compreenderem o quanto te
magoaram e te procurarem pedindo perdão. É necessário que se perdoe independente
do reconhecimento da outra parte, é necessário que se promova o perdão mesmo
que você esteja com a razão. E o não perdoar alguém, faz com que esse alguém
controle sua alegria. Você pode pensar coisas do tipo: “Eu nunca vou perdoá-lo
pelo que ele me fez, você não tem ideia do quanto aquela pessoa me magoou”. E
mais uma vez eu digo, o ressentimento, as mágoas... são coisas difíceis de se
carregar e quando perdoamos alguém, estamos libertando a nós mesmos.
Por outro lado temos a vingança. E já dizia Seu Madruga: "A vingança nunca é plena, mata a alma e envenena." Algumas pessoas nos
magoam tanto que queremos que elas paguem pelo que nos causaram, queremos que
elas sofram assim como sofremos. A vingança nos corrompe e nos deixa cegos, perdemos a
consciência da nossa moral. Fazemos coisas que juramos jamais sermos capazes de
fazer, coisas que consideramos imorais e nos enganamos pensando que a nossa
vingança se auto justifica, afinal “você não sabe o que fulano fez pra mim” blá
blá blá... A vingança é sobre “o que eles fizeram” e nunca sobre “o
sangue em nossas mãos”. A vingança é o mito de que podemos fazer coisas certas
com atitudes más.
Sabe, a vingança infla nosso ego e digo mais, ela é vazia em si. Pessoas que se
atentam muito à justiça própria estão sempre pensando em alguma forma para se
vingar, para fazer justiça com as próprias mãos, para serem a “mão esquerda de
Deus”. Mas você e eu que estamos nessa, estamos muito errados! A vingança é
como se brincássemos de Deus e quiséssemos deixar tudo de acordo com a nossa
própria vontade ou com o que julgamos ser justo, correto. Aí eu me pergunto:
Quem sou eu para ter o controle de tudo isso? De todas essas coisas? Pois é,
não sou nada nem ninguém.
Existe um versículo que diz: “... as nossas justiças são como trapo da
imundícia; e todos nós murchamos como a folha...(Isaías
64:6)
Se a nossa justiça própria é como um trapo, então ela tem pouco valor, ou nada significativo. E embora eu seja daquelas que se importam com a justiça própria e blá blá blá, esse versículo faz muito sentido pra mim, porque sei que a justiça de Deus é maior e melhor que a minha. Ele cuida dos mínimos detalhes! Ele há de cuidar de todas as coisas!
Observe que, deixar que a justiça de Deus seja feita e não a minha, não me torna necessariamente alguém negligente ou omissa diante de circunstâncias injustas, significa colocar em prática o laissez faire (deixe fazer, deixe ir, deixe passar, o mundo vai por si mesmo) e assumir que nós não temos e nem precisamos ter o controle de tudo. Há sempre algo a ser feito, mas há muitas coisas que não cabe a nós.
Por fim, se você ainda deseja que aqueles que te magoaram,
estejam mortos, saiba que você ainda não perdoou. E, se eu não perdoo, eu estou
preso no passado e não estou totalmente aqui e agora, para viver a beleza do
momento presente. Se eu não perdoo, eu é que não estou livre. Que você e eu possamos perdoar. Perdoar o próximo e a nós mesmos. Perdoar.